Decisão sobre vínculo empregatício pode deixar 100 mil desempregados
O Tribunal Superior do Trabalho está discutindo o reconhecimento de vínculo de emprego entre 80 mil motoentregadores e empresas de aplicativo; no Estado, outros 20 mil motoristas podem ser prejudicados
Em trâmite no Tribunal Superior do Trabalho (TST), o possível reconhecimento de vínculo empregatício entre motoristas prestadores de serviço e empresas de aplicativo pode causar o desemprego de até 100 mil motoentregadores e motoristas em Mato Grosso do Sul.
Dois casos envolvendo os motoristas e a empresa Uber do Brasil Tecnologia Ltda. estão sendo analisados pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-I) do TST.
Os embargos em discussão são contra decisões divergentes da Terceira Turma do Tribunal – que reconheceu o vínculo de emprego de um motorista de Queimados (RJ) – e da Quinta Turma – que entendeu que não há relação de emprego entre um condutor de Guarulhos (SP) e a empresa.
No Brasil, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de 2019 determinou que não há vínculo empregatício entre a Uber e os motoristas. De acordo com o tribunal, eles são empreendedores individuais, e não funcionários diretos da empresa, ou seja, são trabalhadores reconhecidos como autônomos.
A decisão foi tomada por todos os 10 ministros que integravam na época a Segunda Seção do STJ. Segundo a determinação da ministra Maria Cristina Peduzzi, relatora do processo oriundo da Terceira Turma, que reconheceu o vínculo de emprego, os argumentos da empresa de aplicativo são premissas distintas das expressas na decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região.
A Terceira Turma adotou, como fundamentos, que a empresa exigia que o condutor ficasse conectado à plataforma digital e exercia “intenso controle sobre o trabalho prestado e a observância de suas diretrizes”.
Após a fala de Peduzzi, o ministro Aloysio Corrêa da Veiga solicitou pedido de vista, para examinar melhor a complexidade do tema, adiando, portanto, sua votação.
O magistrado disse que a 99 e a Uber têm um grande número de processos na Corte e destacou que há mais de 5 milhões de prestadores vinculados à plataforma e que não existe, no Brasil, “legislação específica que permita ao julgador analisar com segurança o tema”.
A ministra Maria Cristina Peduzzi foi favorável ao pedido de vista e votou também pela remessa ao Pleno. A proposição voltará à pauta da SDI-I quando o ministro Cláudio Brandão liberar os processos, em virtude do pedido de vista.
REPERCUSSÃO
Para entender as possíveis consequências da aprovação deste embargo aberto no TST, a reportagem do Correio do Estado entrou em contato com os representantes da Associação de Parceiros de Aplicativos de Transporte de Passageiros e Motorista Autônomo de Mato Grosso do Sul (Applic-MS).
Segundo Paulo Pinheiro, presidente da Applic-MS, a entidade já recebeu diversos processos de motoristas do Estado.
“Desde que começamos com esse projeto de representar a categoria, no início de 2017, recebemos por meio do nosso jurídico em torno de 20 processos, em que esses profissionais se sentiram prejudicados pelas plataformas e buscavam uma correção”, disse Paulo Pinheiro.
Paulo também relata que deve haver, no ano que vem, uma discussão ampla sobre esse tema com o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deputados e senadores em Brasília.
“Pelas falas do futuro presidente [Lula], ele vai nos chamar para uma discussão ampla, pois ele não concorda com os critérios que as operadoras tratam os profissionais de moto e de veículos”, afirmou.
Com base nos dados da Applic-MS, há aproximadamente 20 mil motoristas de aplicativos em Mato Grosso do Sul, e em Campo Grande são cerca de 10 mil profissionais. Em relação aos motoboys e motoentregadores, em Campo Grande, há aproximadamente 4 mil, e no Estado são 80 mil nesse setor nos demais municípios.
EMPRESAS
A Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que representa as principais plataformas de prestação de serviços por aplicativos, afirmou em nota que se diz contrária à possível decisão do reconhecimento de vínculo de emprego entre motoristas e empresas de aplicativo.
“Neste novo modelo de negócios criado pelos aplicativos, os motoristas e entregadores não são empregados, são profissionais independentes que contratam as plataformas como intermediadoras para prestar serviços aos usuários finais”, disse em nota.
Para a Amobitec, essas características de flexibilidade e autonomia afastam qualquer possibilidade de enquadrar a relação dos parceiros com as plataformas como um vínculo de emprego.
A Amobitec ainda enfatiza que as empresas de aplicativo associadas a ela, como a Amazon, Flixbus, 99Food, iFood, Uber, Zé Delivery, Buser, 99taxi e Lalamove, podem colaborar com a formulação de políticas públicas.
Saiba: Com base nos dados da Applic-MS, há aproximadamente 20 mil motoristas de aplicativos em Mato Grosso do Sul; em Campo Grande, são cerca de 10 mil profissionais.
Via Correio do Estado MS